Direitos fundamentais. Alteração de datas e horários de provas de concurso público e estabelecimento de critérios alternativos para o exercício dos deveres funcionais inerentes a cargo público.
Sabemos que a Constituição assegura, como direito fundamental de primeira ordem, que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.
CRFB
Art. 5º. (...)
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
À luz desse direito fundamental, é cabível a alteração de datas e horários de etapas de concurso público para condidato que invoca a impossibilidade de comparecimento por motivos religiosos? E o estabelecimento de critérios alternativos para o regular exercício dos deveres funcionais inerentes a cargo público, em face de servidores que invocam escusa de consciência por motivos de crença religiosa? É admissível? Mesmo que se encontrem em estágio probatório?
O STF resolveu esses polêmicos questionamentos em sede de repercussão geral, durante recente julgamento (RE 611874 e ARE 1099099).
Para bem compreendermos a aplicação desse novel posicionamento, é interessante conhecermos os contornos dos casos concretos que estavam sob análise.
No Recurso Extraordinário (RE) 611874, um candidato adventista, em determinado concurso público, pretendia realizar a avaliação física em data, horário e local diverso do estabelecido no calendário do certame. Já no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1099099, uma professora adventista reprovada no estágio probatório por não trabalhar entre o pôr do sol de sexta-feira e o de sábado questionava o fundamento da sua exoneração.
Para o Supremo, a proteção judicial à liberdade religiosa prevista na Constituição Federal e a fixação de prestação ou critérios alternativos quando invocada escusa de consciência é necessária e obrigatória, desde que não fira a igualdade de competição e do exercício de cargos públicos e sejam observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, e seja preservada a igualdade entre os candidatos. Ficou vencido o entendimento de que não seria razoável, em respeito aos princípios da isonomia e da impessoalidade, a movimentação da máquina estatal para contemplar candidatos impossibilitados de realizar atividade em determinados horários da semana em razão de convicções pessoais, já que a Administração não deveria ficar à mercê de particularidades de cada um dos candidatos (capitaneou a tese vencida o Min. Gilmar Mendes, acompanhado pelo Min. Dias Toffoli e pelo Min. Nunes Marques).
Desse modo, foram fixadas duas teses em repercussão geral:
“Nos termos do artigo 5º, inciso VIII, da Constituição Federal, é possível a realização de etapas de concurso público em datas e horários distintos dos previstos em edital, por candidato que invoca escusa de consciência por motivos de crença religiosa, desde que presente a razoabilidade da alteração, a preservação da igualdade entre todos os candidatos e que não acarreta ônus desproporcional à administração pública, que deverá decidir de maneira fundamentada” (RE 611874)
“Nos termos do artigo 5º, VIII, da Constituição Federal, é possível à administração pública, inclusive durante o estágio probatório, estabelecer critérios alternativos para o regular exercício dos deveres funcionais inerentes aos cargos públicos, em face de servidores que invocam escusa de consciência por motivos de crença religiosa, desde que, presente a razoabilidade da alteração, não se caracterize o desvirtuamento no exercício de suas funções e não acarrete ônus desproporcional à administração pública, que deverá decidir de maneira fundamentada” (ARE 1099099)
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: