Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime). Prisão preventiva. Revisão da necessidade de sua manutenção. Art. 316, parágrafo único, do CPP. Prazo. Inobservância. Revogação automática.
A famigerada Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime) introduziu polêmica regra no parágrafo único do art. 316 do CPP, assim versado:
Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.
Como se percebe, o novel parágrafo único do art. 316 do CP estatui um dever de o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de manutenção da prisão preventiva a cada 90 (noventa) dias, mediante (nova) decisão fundamentada, de ofício, “sob pena de tornar a prisão ilegal”.
A grande dúvida é: e se o juiz não fizer essa revisão no prazo legal (90 dias), quais as consequências jurídicas dessa omissão?
O plenário do STF definiu essa relevante questão em recentíssimo precedente.
No caso, a defesa de um conhecido traficante e líder da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) havia impetrado um habeas corpus (HC 191836) contra decisão monocrática de ministro do STJ que havia indeferido pleito liminar em outro habeas corpus lá impetrado e no qual se alegava a inobservância desse preceito legal.
O Ministro Marco Aurélio, relator desse novo HC, entendeu que se estaria diante de flagrante ilegalidade e, por isso, afastou o óbice traduzido na Súmula 691 do STF para deferir liminar ordenando a soltura do paciente, ao argumento de que a inobservância do prazo disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP implica a revogação automática da prisão preventiva.
“Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.” (Súm. 691 do STF)
A Procuradoria-Geral da República, então, ingressou com pedido de suspensão de liminar (SL 1395), com base no que dispõe o art. 4º da Lei 8.437/1992:
Art. 4° Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.
O Ministro Luiz Fux, presidente do STF, deferiu a suspensão da liminar (medida de contracautela) para determinar que o paciente do habeas corpus em testilha fosse novamente recolhido à prisão (a esta altura, já estava foragido em outro país, segundo a inteligência da Polícia Federal). E o plenário da Corte acabou por referendar essa decisão monocrática.
Prevaleceu o entendimento de que a suspensão de ato jurisdicional de outro integrante do STF pelo presidente somente é admissível no caso em função da absoluta excepcionalidade da situação, notadamente porque a colocação do réu em liberdade representava grave lesão à segurança e à ordem públicas, haja vista a gravidade concreta do crime pelo qual já condenado o réu em duas instâncias (tráfico transnacional de mais de quatro toneladas de cocaína, por intermédio de organização criminosa violenta e que opera em âmbito internacional), algo a revelar a sua periculosidade in concreto, e não com apoio em meras suposições.
A par disso, o plenário fixou orientação na linha de que a inobservância do prazo de 90 dias (CPP, art. 316, parágrafo único) para a reavaliação da necessidade de manutenção da prisão preventiva não implica a sua revogação automática, devendo a defesa instar o juízo competente a fim de que reavalie a legalidade e a atualidade dos fundamentos que levaram à decretação da custódia cautelar.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: