Servidor público. CRFB, art. 37, X. Revisão geral anual. Separação de Poderes. Poder Judiciário.
Todo servidor público conhece bem o teor do art. 37, X, da Carta Maior, assim vazado:
Art. 37. (...)
X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;
De fato, era corrente a crença, no âmbito do funcionalismo público, de que essa “revisão geral anual”, prevista no dispositivo constitucional em liça, estaria vocacionada a proteger a remuneração dos agentes públicos contra os prejuízos advindos do fenômeno inflacionário. Boa parte da doutrina, aliás, caminhava nessa direção. Pudera: o preceito constitucional em mira diz expressamente que fica “assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices”.
O Supremo Tribunal Federal, em vários pronunciamentos, entendeu que, a despeito da mora do chefe do Poder Executivo em deflagrar o processo dessa revisão anual dos vencimentos e subsídios dos servidores públicos, não cabe ao Poder Judiciário outra alternativa senão simplesmente declará-la (no caso, em ADI por omissão), não lhe competindo, no entanto, deflagrar o processo legislativo nem fixar prazo para que o chefe do Poder Executivo o faça:
“Esta Corte firmou o entendimento de que, embora reconhecida a mora legislativa, não pode o Judiciário deflagrar o processo legislativo, nem fixar prazo para que o chefe do Poder Executivo o faça. Além disso, esta Turma entendeu que o comportamento omissivo do chefe do Poder Executivo não gera direito à indenização por perdas e danos.” (RE 424584, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 17/11/2009, DJe-081 DIVULG 06-05-2010 PUBLIC 07-05-2010 EMENT VOL-02400-05 PP-01040)
Como essa declaração da mora, por parte do STF, não surtia qualquer efeito, e diante da impossibilidade de o Judiciário agir como legislador positivo para fixar índices de revisão da remuneração do funcionalismo público, surgiram milhares de ações de servidores públicos que postulavam a condenação, do respectivo ente público, ao pagamento de indenização equivalente à inflação do período em que relação ao qual não houve qualquer reposição inflacionária.
O Excelso Pretório, entrementes, fixou entendimento, em repercussão geral, na linha de que o não encaminhamento de projeto de lei de revisão anual dos vencimentos dos servidores públicos, previsto no inciso X do art. 37 da CF/1988, não gera direito subjetivo a indenização. Deve o Poder Executivo, no entanto, se pronunciar, de forma fundamentada, acerca das razões pelas quais não propôs a revisão.
“O não encaminhamento de projeto de lei de revisão anual dos vencimentos dos servidores públicos, previsto no inciso X do art. 37 da CF/1988, não gera direito subjetivo a indenização. Deve o Poder Executivo, no entanto, se pronunciar, de forma fundamentada, acerca das razões pelas quais não propôs a revisão.
Com base nessa orientação, o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, ao apreciar o Tema 19 da repercussão geral, negou provimento a recurso extraordinário em que discutida a existência do direito a indenização, devida a servidores públicos em decorrência da desvalorização anual de seus vencimentos em face da inflação e da ausência de norma que promova o reajuste periódico do montante percebido (Informativos 630, 741 e 761). Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso, o qual, em assentada anterior, afirmou não vislumbrar no art. 37, X, da CF dever específico de que a remuneração dos servidores seja objeto de aumentos anuais e, tampouco, em percentual obrigatoriamente correspondente à inflação apurada no período. A exegese do termo “revisão” abarca entendimento no sentido de que o dispositivo em questão exige uma avaliação anual, que pode resultar, ou não, em concessão de aumento. O preceito em questão deve ser interpretado em conjunto com outros dispositivos que se distanciam da lógica de reajustes automáticos e de indexação econômica (CF, arts. 7º, IV, e 37, XIII). A tese segundo a qual a adoção de índice inferior à inflação de determinado período importaria automaticamente em degradação do direito de propriedade merece temperamentos. Isso porque a indexação, embora legítima na tentativa de neutralizar o fenômeno inflacionário, tem como efeito colateral a retroalimentação desse mesmo processo de inflação. Em realidade os reajustes devem ser condicionados às circunstâncias econômicas de cada momento. O que o art. 37, X, da CF impõe é que o chefe do Poder Executivo deve se pronunciar anualmente e de forma fundamentada sobre a conveniência e a possibilidade de reajuste anual do funcionalismo.
Na sessão de 2.10.2014, o ministro Teori Zavascki, ao acompanhar divergência inaugurada pelo ministro Roberto Barroso, também negou provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelos ministros Rosa Weber e Gilmar Mendes. Naquela oportunidade, o ministro Teori registrou que, de fato, o inciso X do art. 37 da CF, na redação dada pela EC 19/1998, estabelece o direito dos servidores públicos à revisão anual de sua remuneração e, em contrapartida, o dever da Administração Pública de encaminhar, aprovar e cumprir lei específica sobre a matéria. Entretanto, a Constituição não fixa critérios ou índices a serem observados na revisão. Determina, apenas, que ela seja efetuada sem distinção de índices entre os beneficiados. Por isso, não há a possibilidade de se extrair do texto constitucional qualquer indicação de índice mínimo, ainda que para efetuar a manutenção real do poder aquisitivo dos servidores públicos. Portanto, não existe na Constituição nenhuma disposição que garanta a reposição anual dos índices inflacionários. De todo modo, não cabe, no caso, invocar o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos, visto que a jurisprudência do STF é no sentido de que sua eventual ofensa se dá quando há redução do valor nominal dos vencimentos, mas não quando se deixa de reajustá-los para repor seu poder de compra. A pretensão deduzida no recurso extraordinário em comento acaba por transferir a ausência de lei específica de revisão de vencimentos para o domínio da responsabilidade civil do Estado. Em razão da ausência de previsão constitucional relativa a índices mínimos de revisão anual dos vencimentos, suprir essa falta por sentença equivaleria a legislar.” RE 565089 /SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 25.9.2019. (RE-565089)
Havia, entretanto, uma outra questão que pendia de resolução junto ao STF: pode o Judiciário determinar ao Poder Executivo que encaminhe projeto de lei que efetive o direito à revisão geral anual?
Em recentíssima decisão, o plenário do STF definiu mais essa questão relacionada ao art. 37, X, da CRFB.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) tinha reconhecido a mora do Município de Leme para conceder a revisão geral anual. Mais do que isso, determinara que o prefeito enviasse à respectiva Câmara Municipal, no prazo de 30 dias, projeto de lei que efetivasse esse direito.
Julgando o tema em sede de repercussão geral (RE 843112, Tema 624), o Supremo entendeu que, da interpretação do art. 37, X, da CRFB, não se depreende, do texto, um significado inequívoco para a expressão “revisão”. Assim como já havia sido dito no RE 565089 (Tema 009), reiterou-se o entendimento de que a reposição das perdas inflacionárias em prol de servidores públicos não pode ser considerada constitucionalmente obrigatória. Demais disso, salientou-se a necessidade de compatibilizar a “revisão geral anual” com restrições orçamentárias, ajustes fiscais e eventual compensação de outras formas de aumento remuneratório já concedidas.
Com base nessa linha de intelecção, chegou-se à seguinte tese, que precisamos gravar bem ante a grande chance de vir a ser cobrada em concursos públicos:
“O Poder Judiciário não possui competência para determinar ao Poder Executivo a apresentação de projeto de lei que vise a promover a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos, nem tampouco para fixar o respectivo índice de correção” (RE 843112, Tema 624)
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo:
“É devido o pagamento em dobro da remuneração de férias, incluído o terço constitucional, com base no art. 137 da CLT, quando, ainda que gozadas na época própria, o empregador tenha descumprido o prazo previsto no art. 145 do mesmo diploma legal.” (Súm. 450 do TST).
Lembre-se que a previsão constitucional do art. 37, X, não se confunde com a garantia da irredutibilidade vencimental (CRFB, art. 37, XV), que impede a redução do valor nominal da remuneração dos agentes públicos.