Emenda Constitucional. Iniciativa parlamentar. Regime jurídico de servidores públicos federais. Iniciativa privativa do Presidente da República: inocorrência. Art. 61, § 1º, da CRFB: inaplicabilidade. ADI 5296.
A EC 45/2004 (“Reforma do Judiciário”) introduziu ao art. 134 da CRFB um § 2º para prever que as Defensorias Públicas Estaduais gozam de autonomia funcional e administrativa e possuem a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias.
CRFB
Art. 134. (...)
§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º .
Posteriormente, a EC 74/2013 estabeleceu a aplicação desse mesmo § 2º do art. 134 às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal:
CRFB
Art. 134. (...)
§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º .
§ 3º Aplica-se o disposto no § 2º às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal.
Logo após a promulgação da EC 74/2013, a então Presidente da República ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5296) questionando a sua constitucionalidade, ao argumento de que somente o chefe do Poder Executivo poderia propor alteração referente aos servidores públicos da União ou ao seu regime jurídico, no que haveria vício de iniciativa a inquinar de inconstitucional a aludida EC.
O Supremo, no entanto, afastou o argumento de vício de iniciativa (inconstitucionalidade formal).
Pontuou-se que a matéria objeto da EC 74/2013 não está no âmbito de incidência da cláusula de iniciativa legislativa reservada à Presidência da República (CRFB, artigo 61, § 1º). Isso porque a disciplina constitucional sobre a iniciativa em matéria de emendas à Constituição é diversa, constando do art. 60 da CRFB:
CRFB
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
Logo, a iniciativa privativa para a propositura de lei não precisa ser observada em matéria de apresentação de proposta de emenda constitucional (PEC). Do contrário — disse o Supremo —, restaria inviabilizada a edição de emendas constitucionais sobre matérias de iniciativa legislativa privativa do Presidente da República (CRFB, art. 61, § 1º), do Supremo Tribunal Federal (CRFB, art. 93) e do procurador-geral da República (CRFB, art. 128, § 5º), dentre outros casos de iniciativa privativa previstos na Constituição Federal, já que nenhum desses órgãos com iniciativa legislativa privativa consta do rol de legitimados para propor emendas à Constituição (CRFB, art. 60), e, de outro lado, nenhum dos legitimados dispostos no art. 60 da CRFB poderia propor emenda sobre tais matérias. Demais disso, lembrou o Supremo que entendimento diverso permitiria o questionamento de nada menos do que 37 (trinta e sete) emendas constitucionais de indiscutível relevância (como a Reforma Previdenciária, a Reforma do Judiciário e do ajuste fiscal), as quais não teriam observado as regras constitucionais de iniciativa para a propositura de lei (embora tenham sido propostas por legitimados previstos no art. 60 da CRFB). Ou seja, seria “o caos!!!” (rs).
Sob o enfoque da constitucionalidade material da EC 74/2013, o Supremo recordou que a assistência jurídica aos hipossuficientes é um direito fundamental (CRFB, art. 5º, LXXIV) e garante o amplo acesso à Justiça, cabendo às Defensorias concretizar esse direito fundamental. Ante a relevância dessa instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado e a quem compete, “como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados (CRFB, art. 134), pontuou que a interpretação da Constituição Federal ampara e legitima o reconhecimento da autonomia das Defensorias Públicas.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: