STJ, CC 182.977. Estelionato. Tentativa de saque com apresentação de cheque fraudulento. Hipótese não prevista na Lei n. 14.155/2021. Consumação do crime no local onde a vítima possui conta bancária.
Situação Fática: Juca morava em Porto Velho/RO e, por isso, lá abriu sua conta bancária.
Mudou-se, então, para Brasília/DF, visando estudar para concurso.
Certo dia, sua gerente lhe telefonou informando que um cheque seu havia sido devolvido por falta de provisão de fundos, após ter sido apresentado em Curitiba/PR.
Juca, contudo, informou à sua gerente que há anos não emite cheque algum, tendo havido algum tipo de falsificação da cártula.
Controvérsia: Nessa hipótese, de quem é a competência para processar e julgar o crime de estelionato (CP, art. 171, caput, c/c art. 14, II): da comarca de Porto Velho/RO, da comarca de Brasília/DF ou da comarca de Curitiba/PR?
Decisão: Para o STJ, o crime de estelionato (ou sua tentativa) praticado por meio saque de cheque fraudado compete ao Juízo do local da agência bancária da vítima.
Fundamentos: O crime de estelionato (CP, art. 171, caput) é delito material ou de resultado, que se consuma com a efetiva obtenção da vantagem ilícita em prejuízo da vítima.
Em razão disso, o STJ entendia que, nos casos em que a vítima era ludibriada pelo estelionatário a efetuar transferência bancária (ou depósito), a competência para processar e julgar o crime seria do juízo do local em que se situasse a conta bancária destinatária da transferência empreendida pela vítima (CPP, art. 70, caput).
Em que pese a lógica do raciocínio, isso trazia muitas dificuldades em termos de investigação criminal, máxime quando a conta de destino dos valores transferidos pela vítima se situava longe do local onde ocorrido o fato em si.
Para alterar esse cenário, a Lei 14.155/21 inseriu um § 4º ao art. 70 do CPP a fim de dispor que “Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.”.
No caso apresentado, não se trata de estelionato perpetrado mediante depósito, emissão de cheques sem fundos ou com pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, para que se pudesse acionar o novel § 4º do art. 70 do CPP e fixar a competência de acordo com o local do domicílio da vítima.
Em realidade, houve algum tipo de falsificação em relação à cártula (no mínimo, uma falsificação de assinatura).
Por isso, entendeu o STJ que a competência para processar e julgar o crime, em situações assim, segue sendo do juízo em que localizada a conta bancária da vítima, não sendo aplicável à hipótese o § 4º do art. 70 do CPP.
Desse modo, considerando que a agência correspondente à conta bancária da vítima se situava em Porto Velho/RO, era da capital rondoniense a competência para processar e julgar o estelionato praticado.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: