STJ, EREsp 1.265.625. Acordão proferido pela Justiça Estadual. Habilitação da União na qualidade de assistente simples. Interesse jurídico específico demonstrado.
Situação Fática: Imagine um processo entre dois particulares que correu na Justiça Estadual.
A parte sucumbente no acórdão de 2º grau opõe embargos de declaração que não são conhecidos.
No seguimento, a mesma parte interpõe agora recurso especial requerendo a anulação do julgamento dos aclaratórios a fim de que o STJ determine que o TJ profira novo julgamento aos embargos de declaração.
Com os autos subindo ao STJ, a União peticiona nos autos requerendo a sua intervenção como assistente simples por alegar ter interesse jurídico no feito.
A intervenção de terceiro é admitida nos autos, não tendo sido impugnada a sua admissibilidade.
Controvérsia: Sendo o recurso especial provido para anular o julgamento dos aclaratórios e considerando que União agora figura na lide como assistente simples, quem deverá julgar no 2º grau os embargos de declaração antes opostos por um dos particulares parte do processo? O TJ que proferiu o primeiro julgamento de mérito a ser integrado nos aclaratórios ou o respectivo TRF com jurisdição territorial sobre o Estado-Membro?
Decisão: Para o STJ, será o TRF que proferirá novo julgamento para os aclaratórios, independentemente de o primeiro julgamento a ser integrado haver sido proferido por TJ.
Fundamentos: O STJ aplicou o art. 109, I, da CF, que prevê que a competência cível da Justiça Federal se dá em razão da pessoa (ex ratione personae), devendo os autos serem remetidos da Justiça Estadual para a Federal sempre que União, autarquia (ou fundação) federal ou empresa pública federal figure como assistente simples.
Como a assistência simples, nos termos do art. 119, parágrafo único, do CPC, pode ser “admitida em qualquer procedimento e em todos os graus de jurisdição, recebendo o assistente o processo no estado em que se encontre”, é juridicamente possível que um processo inicialmente envolvendo dois particulares comece perante a Justiça Estadual e, após o ingresso no feito do ente federal, seja remetido para a Justiça Federal e lá termine.
Destacamos que o STF possui jurisprudência no sentido de que o mero pedido de ingresso de ente federal no feito como “assistente” ou “oponente” já gera incompetência automática da Justiça Estadual, deslocando a competência para a Justiça Federal, inclusive para apreciar a admissibilidade do próprio pedido de intervenção de terceiro (ARE 994110). Por se tratar de competência absoluta, não se aplica a regra da perpetuatio jurisdictionis prevista no art. 43 do CPC.
A posição está consolidada nas Súmulas 150 (“Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas.”) e 224 (“Excluído do feito o ente federal, cuja presença levara o Juiz Estadual a declinar da competência, deve o Juiz Federal restituir os autos e não suscitar conflito.”), ambas do STJ.
O presente julgado gera alguma estranheza, pois a assistência simples só foi admitida em sede de recurso na instância excepcional (extraordinário/especial).
Dado o fato de o STJ (como também o STF) ser um tribunal federal com ascendência sobre TJs e TRFs, ele próprio já possui a competência para aferir a existência ou não de interesse jurídico que legitime o ingresso da União como assistente simples no feito.
E uma vez admitido o ingresso de ente federal, a competência será automaticamente deslocada para a Justiça Federal, para onde os autos deverão ser baixados, seja para se proferir novo julgamento, seja para fins de cumprimento de sentença (execução).
No caso é completamente irrelevante o fato de o recurso não haver sido interposto pela União tampouco de o acórdão a ser integrado pelos embargos declaratórios haver sido proferido por um TJ, pois à época a União ainda não figurava como assistente simples.
Por último, destacamos que a assistência simples não se confunde com a assistência anômala ou especial prevista no art. 5º, parágrafo único, da Lei 9.469/97, uma vez que a primeira exige interesse jurídico (relação jurídica entre assistente e assistido que possa ser afetada pela lide) enquanto a última exige apenas o interesse econômico.
A distinção é relevante porque o STJ interpreta restritivamente o art. 109, I, da CF como se apenas a assistência simples – e não a anômala/especial – estivesse abarcada pelo dispositivo constitucional, é dizer, apenas a existência de interesse jurídico – não basta o econômico – desloca a competência para a Justiça Federal no ingresso de ente federal na lide.
Assim, o pedido e a admissão da União como assistente simples deslocaria e fixaria a competência para Justiça Federal, enquanto o ingresso dessa como assistente anômala/especial ainda manteria os autos na Justiça Estadual.
Contudo, como o STJ tem precedente entendendo que quando o ente público (antes admitido como assistente anômalo) recorrer passará a ser considerado como parte, na hipótese de recurso interposto por ente federal previsto no art. 109, I, da CF haverá o deslocamento da competência da Justiça Estadual para a Federal (AgREsp 1533507).
Dessa maneira, frisamos que se a modalidade de intervenção da União admitida na fase recursal perante o STJ houvesse sido a assistência anômala/especial da Lei 9.469/97 (interesse meramente econômico), não haveria o deslocamento da competência para a Justiça Federal, de maneira que ainda seria o TJ quem julgaria novamente os embargos de declaração opostos pelo particular.
Entretanto, como a intervenção admitida no presente caso foi a assistência simples do CPC (interesse jurídico), impõe-se que seja o TRF que julgue os aclaratórios pendentes, ainda que esse recurso não haja sido interposto pela União.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: