STJ, HC 582.678. Acordo de colaboração premiada. Crimes cometidos em coautoria. Possibilidade. Organização criminosa estruturada. Desnecessidade.
Situação Fática: Jagunço Mulambo participou de esquema criminoso no bojo do qual foram perpetrados diversos delitos contra a Administração Pública, em concurso de agentes, e pretende celebrar acordo de colaboração premiada com o Ministério Público.
Não chegou a restar configurada, contudo, autêntica organização criminosa, uma vez que os requisitos legais exigidos pelo art. 1º, § 1º, da Lei 12.850/2013 não foram preenchidos.
Controvérsia: É possível celebrar acordo de colaboração premiada – o qual, como se sabe, é disciplinado pela Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013) - quando o crime praticado não se dera no contexto de uma organização criminosa?
Decisão: Para o STJ, é possível celebrar acordo de colaboração premiada em quaisquer condutas praticadas em concurso de agentes.
Fundamentos: De início, cumpre lembrar que há diversos regramentos legais que preveem perdão judicial ou causas de diminuição de pena em prol réus delatores, positivadas tanto no Código Penal (ex.: § 4º, do art. 159 do Código Penal, referente ao crime de extorsão mediante sequestro) quanto na legislação especial (ex.: § 2º do art. 25 da Lei 7.492/1986 - que define os crimes contra o sistema financeiro nacional; art. 8º, parágrafo único, da Lei 8.072/1990 - Lei de Crimes Hediondos; art. 1º, § 5º, da Lei 9.613/1998 - que dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; arts. 13 e 14 da Lei 9.807/1999 - que estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas).
O instituto da colaboração premiada, no entanto, está disciplinado somente na Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013, arts. 3º-A a 7º).
Em que pese o Código de Processo Penal não regulamente o procedimento de formalização dos acordos de colaboração premiada, o STJ considerou que a Lei 12.850/2013 não estabelece, de forma expressa, que os meios de obtenção de prova nela previstos (como é o caso da colaboração premiada) incidem tão somente no contexto de uma organização criminosa.
Ademais, não há óbice a que as disposições de natureza majoritariamente processual previstas na referida Lei sejam aplicadas às demais situações de concurso de agentes (no que não for contrariada, logicamente, por disposições especiais, eventualmente existentes).
Vale recordar, nesse sentido, que o art. 3º do CPP permite que a lei processual penal seja aplicada por analogia.
Lado outro, o Supremo Tribunal Federal já recebeu diversas denúncias lastreadas em elementos probatórios oriundos de colaborações premiadas em que não houve a imputação específica ou condenação pelo crime de "promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa" (art. 2º da Lei 12.850/2013).
De mais a mais, embora muitas vezes o caso concreto não revele uma estrutura propriamente de organização criminosa, nem por isso os associados à prática delitiva não mereceriam um acordo com o Estado para receberem os benefícios da colaboração premiada pari passu ao auxílio prestado aos aparatos de investigação criminal.
Por tudo isso, mesmo que não se esteja diante de um cenário de crime envolvendo uma organização criminosa, é possível, em quaisquer condutas praticadas em concurso de agentes, celebrar acordo de colaboração premiada.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: