STJ, REsp 1.391.954. Seguro de vida. Instituidor casado não separado de fato ou judicialmente. Concubina beneficiária. Impossibilidade. Expressa vedação legal. Art. 793 do CC/2002.
Situação Fática: João é casado com Maria, de quem nunca se separou (de fato ou de direito), mas mantém um relacionamento adulterino com Camila (concubina).
Controvérsia: Ao contratar um seguro de vida, seria válido que João estipulasse uma cláusula instituindo Camila (concubina ou “amante”) como beneficiária?
Decisão: Para o STJ, não. Razões de ordem moral acolhidas pelo ordenamento jurídico brasileiro impedem que o(a) concubino(a) seja beneficiário(a) do seguro de vida instituído pelo cônjuge/companheiro(a) adúltero(a).
Fundamentos: O art. 1.474 do revogado CC/1916 proibia expressamente que aquele que não pudesse receber doação fosse instituído como beneficiário de seguro por parte do segurado (“Não se pode instituir beneficiário pessoa que for legalmente inibida de receber a doação do segurado.”).
Não obstante a regra não tenha sido repetida no vigente CC/2002, o art. 793 traz disposição que permite expressamente que o companheiro(a) estipule validamente a indenização em favor de sua companheira (“É válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato.”).
Surgiu a dúvida se uma interpretação a contrario sensu do art. 793 do CC proibiria o(a) concubino(a) de ser beneficiário(a) do seguro de vida, invalidando essa cláusula em eventual contrato.
O STJ, seguindo a posição dominante nos TJs, entendeu que tal cláusula seria, sim, nula de pleno direito.
Admitir que concubino(a) figure como beneficiário de seguro contraria os valores e princípios jurídicos que protegem a família, além de ser uma forma de fraude ou violação indireta à lei, nos termos do art. 166, VI, do CC, uma vez que ainda persiste na codificação civil a proibição expressa de o concubino figurar como donatário (CC, art. 550) bem como de figurar como herdeiro ou legatário (CC, art. 1.801, III, 1ª parte), sempre que o doador ou testador for o cônjuge/companheiro(a) adúltero(a).
Esclarecemos que o fato de alguém ser casado não obsta que constitua união estável desde que esteja separado de fato, nos termos da ressalva constante na parte final do § 1º do art. 1.723 do CC.
Entretanto, se alguém for casado e não estiver separado de fato, um relacionamento paralelo implicará o concubinato previsto no art. 1.727 do CC, ao invés do companheirismo.
Em reforço argumentativo, o STJ citou ainda que o STF, em repercussão geral, não admitiu a existência de união estável concomitante ao casamento, tampouco a existência de uniões estáveis paralelas, classificando tais relações como concubinato.
Destacamos os Temas 526 e 529 julgados pelo Supremo: (segue...)
“Tema 526 do STF. A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro.”
“Tema 529 do STF. Assim o objeto da proibição contida no art. 793 do CC abarca unicamente o concubinato (concubinato impuro) do art. 1.727 do CC não abarcando a união estável (concubinato puro) do art. 1.723 do CC.”
Assim, é possível que o cônjuge ou o(a) companheiro(a) do segurado(a) figure como beneficiário(a) do seguro, mas jamais o(a) concubino(a).
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: