STJ, REsp 1.610.844. Penhora de saldo em conta corrente conjunta. Extensão. Presunção relativa de rateio em partes iguais. Integralidade dos valores. Pessoa física ou jurídica distinta da instituição financeira mantenedora.
Situação Fática: João e Maria são titulares de conta-corrente conjunta solidária junto ao Banco Mercantil Futuro S/A, com saldo de R$ 100.000,00.
João também contraiu, sozinho, um contrato de financiamento com o Banco XYZ S/A, no qual Maria não é mutuária nem fiadora, é dizer, não figura no contrato.
Controvérsia: Na hipótese de inadimplemento do financiamento por João que origine um processo de execução movido pelo Banco XYZ, se houver a penhora do dinheiro em depósito (Bacen-Jud ou Sisbajud), nos termos do art. 854 do CPC, podem ser tornados indisponíveis os R$ 100.000,00 correspondentes à totalidade do saldo da conta conjunta mantida por João e Maria? Ou apenas a metade (R$ 50.000,00) relativa à fração ideal de João, já que Maria não seria obrigada pelo débito junto ao Banco XYZ?
Decisão: Para o STJ, apenas a parte relativa à fração de João (ou seja, a metade, correspondente a R$ 50.000,00) poderia ser objeto da constrição judicial.
Isso porque é presumido, em regra, o rateio em partes iguais do numerário mantido em conta-corrente conjunta solidária quando inexistente previsão legal ou contratual de responsabilidade solidária dos correntistas pelo pagamento de dívida imputada a um deles.
Não será possível a penhora da integralidade do saldo existente em conta conjunta solidária no âmbito de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta da instituição financeira mantenedora, sendo franqueada aos cotitulares e ao exequente a oportunidade de demonstrar os valores que integram o patrimônio de cada um, a fim de afastar a presunção relativa de rateio.
Fundamentos: Existem duas espécies de conta-corrente bancária: a individual (ou unipessoal), em que há um único titular que a movimenta por si ou por meio de procurador, e a conjunta (ou coletiva), cuja titularidade é de mais de uma pessoa.
A conta conjunta ainda ser: (i) fracionária, sendo movimentada apenas por todos os titulares ao mesmo tempo; ou (ii) solidária, em que qualquer um dos titulares pode movimentar a integralidade dos fundos disponíveis.
A modalidade mais comum no dia-a-dia é exatamente a conta-corrente conjunta solidária, hipótese do presente enunciado.
Como o art. 265 do CC aduz que a solidariedade não se presume, resulta da lei ou da vontade das partes, a solidariedade se interpreta restritivamente.
Por isso a conta conjunta só produz efeitos especificamente em relação à instituição financeira mantenedora da conta (Banco Mercantil Futuro), mas não em relação a terceiros (Banco XYZ).
O STJ entendeu que o cotitular de conta-corrente conjunta não pode sofrer constrição em virtude de negócio jurídico celebrado com terceiros pelo outro cotitular e por ele inadimplido.
Nessa hipótese, o cotitular que não é responsável pela dívida particular do outro poderá, dentro do saldo da conta conjunta, comprovar os valores que compõem o patrimônio de cada um, a fim de excluir a sua parte da penhora.
Na ausência ou na impossibilidade de prova nesse sentido, far-se-á a divisão do saldo da conta-corrente conjunta de modo igualitário, presumindo-se a fração ideal em partes iguais, isto é, de metade para cada um (50%) em havendo 2 (dois) cotitulares.
Cabe salientar que, em relação ao próprio banco mantenedor da conta (Banco Mercantil Futuro, no exemplo dado), haverá solidariedade por força de contrato de abertura da conta-corrente conjunta, de modo que a totalidade do saldo, em princípio, poderá ser penhorada para adimplir qualquer dívida, independente de se originar de apenas um ou de ambos os correntistas conjuntos.
Desse modo, o STJ dirimiu, através da Corte Especial, divergência que existia entre a 1ª e 2ª Seção do tribunal, adotando a sistemática de precedente do art. 927, III, do CPC, uma vez que o julgado adotou a forma de incidente de assunção de competência (IAC).
Gize-se, por fim, que o presente entendimento de penhora de saldo de conta-corrente conjunta valerá inclusive para as execuções fiscais que cobrem divida particular de só um dos cotitulares.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: