STJ, REsp 1.638.772. Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta - CPRB. Lei n. 12.546/2011. Inclusão do ICMS na base de cálculo. Retorno dos autos para retratação.
Situação Fática: A empresa ABC Ltda. ao realizar planejamento tributário (elisão fiscal) optou por aderir à contribuição previdenciária sobre a receita bruta (CPRB) em substituição àquela normalmente incidente sobre a folha de salários e pagamentos (contribuição patronal previdenciária).
Controvérsia: ABC Ltda. poderia excluir da base de cálculo da CPRB o valor de ICMS, imposto do qual também é contribuinte?
Decisão: Para o STJ, não. Os valores recolhidos a título de ICMS integram a base de cálculo da CPRB.
Fundamentos: Num primeiro momento, ao julgar a questão sob a ótica infraconstitucional, o STJ entendeu que o ICMS deveria ser excluído da base de cálculo da CPRB (Tema 994 dos recursos especiais repetitivos).
A Fazenda Nacional, no entanto, interpôs recurso extraordinário, que ficou retido na origem nos termos do art. 1.037, II, do CPC, uma vez que a mesma questão também estava afetada à sistemática de Repercussão Geral.
Contudo, posteriormente, ao julgar o Tema 1.048 da Repercussão Geral, o STF, analisando a questão sob a ótica constitucional, concluiu de forma diversa do STJ para entender que “É constitucional a inclusão do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta – CPRB”.
Como consequência, num segundo momento, o STJ teve de exercer o juízo de retratação do julgamento repetitivo que contrariou o acórdão paradigma de repercussão geral, nos termos dos arts. 1.040, II, e 1.041, § 1º, 1ª parte, do CPC, restando superado o Tema 944 de Recurso Repetitivo.
Esse juízo de retratação é o que foi noticiado no Informativo.
É interessante lembrar que a EC 42/03 inseriu o § 13 ao art. 195 da CF e permitiu a instituição de contribuição previdenciária substitutiva daquela incidente sobre a folha de salários e pagamentos prevista no art. 195, I, ‘a’, da CF c/c art. 22 da Lei 8.212/91, tendo como nova materialidade a receita ou o faturamento, num bis in idem em relação à COFINS e ao PIS já previstos nos arts. 195, I, ‘b’, e 239 da CF.
No âmbito do então Plano Brasil Maior foi editada a MP 540/11, convertida na Lei 12.546/11, que instituiu a CPRB, com o escopo de desonerar a folha de salários e pagamentos para reduzir a carga tributária e aumentar o emprego.
A substituição, que era inicialmente obrigatória às empresas listadas nos arts. 7º e 8º da referida lei, após alterações promovidas pela Lei 13.161/15, passou a ser facultativa.
As empresas têm a faculdade de aderir ou não ao sistema substitutivo, caso concluam que a sistemática da CPRB é mais benéfica do que a contribuição sobre a folha.
Mesmo que a atual Reforma da Previdência (EC 103/2019) tenha proibido, doravante, o estabelecimento de novas hipóteses de substituição da contribuição sobre a folha de salário por outras contribuições envolvendo a receita ou o faturamento, dando nova redação ao § 9º e revogando o § 13 do art. 195 da CF, expressamente ressalvou no art. 30 da EC 103/19 a recepção da legislação infraconstitucional em vigor que já previa a substituição da tributação por ocasião da promulgação da referida EC.
Realizada a opção à tributação pela CPRB, surge a dúvida se o valor recolhido a título de ICMS pela empresa poderia ser abatido da base de cálculo dessa contribuição, à semelhança do que já ocorre quanto ao PIS e à COFINS nos termos da tese do Tema 69 da Repercussão Geral (“O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”).
A natureza facultativa da CPRB pesou bastante na fundamentação adotada pelo STF para entender pela impossibilidade de exclusão do ICMS. Tratando-se a CPRB de uma opção à disposição do contribuinte, o Poder Judiciário deveria ter uma atuação mais contida para não ampliar demasiadamente o benefício, diferentemente do que ocorreria diante do PIS e da COFINS, enquanto contribuições compulsórias.
O § 7º do art. 9º da Lei 12.546/11 prevê que apenas podem ser excluídas da receita bruta da CPRB: as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos (inciso I); o IPI (inciso III); e ICMS-ST (responsabilidade por substituição tributária) (inciso IV). É dizer, a legislação tributária é omissa quanto à possibilidade de exclusão do ICMS incidente sobre operações normais (sem responsabilidade por substituição tributária).
O STF entendeu que o conceito de receita abarca o total das receitas auferidas no mês pelo contribuinte, que compreende a receita bruta assim definida no art. 12, caput, incisos I a IV, do DL 1.598/1977, com redação dada pela Lei 12.973/14.
Permitir que outros tributos também incidentes sobre a receita sejam abatidos da base de cálculo da receita “bruta” acabaria, na prática, por converter a receita de “bruta” em “líquida” conforme previsão do art. 12, § 1º, III, do referido DL.
Aplicando o princípio da legalidade em matéria tributária previsto no art. 150, I, da CF e no art. 97, incisos I a IV, do CTN, apenas é possível excluir da base de cálculo do tributo os itens expressamente previstos na legislação.
Sendo silente a lei quanto ao abatimento ou exclusão de alguma materialidade normalmente compreendida no fato gerador da exação, não é possível decotá-la do aspecto quantitativo do fato gerador, devendo integrar a obrigação e o crédito tributários.
A contrario sensu, como a permissão de diminuição de outros tributos incidentes sobre a receita apenas se aplica à receita líquida enquanto base de cálculo – e não à bruta -, estender essa isenção ou benefício fiscal violaria a interpretação literal ou aplicação restritiva da legislação tributária prevista no art. 111 do CTN, além de implicar que o Poder Judiciário atuasse abusivamente como legislador positivo, violando a reserva legal específica prevista no art. 150, § 6º, da CF, em usurpação ao princípio da separação dos poderes.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: