STJ, REsp 1.937.821. ITBI. Base de cálculo. IPTU. Vinculação. Inexistência. Valor venal declarado pelo contribuinte. Presunção de veracidade. Revisão pelo fisco. Processo administrativo. Possibilidade.
Situação Fática: João apresentou ao Cartório de Registro de Imóveis uma escritura pública de compra e venda de certo bem imóvel lá registrado.
Embora o preço da alienação tenha sido de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), o ITBI foi calculado pela Prefeitura tendo como base o valor venal do imóvel constante da última Planta Genérica de Valores aprovada pelo Poder Legislativo Local para fins do IPTU, que corresponde a R$ 700.000,00 (setecentos mil reais).
Controvérsia: João argumentou que o valor da transação declarado pelo contribuinte goza de presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente poderia ser afastada pelo Fisco mediante a regular instauração de processo administrativo para fins de lançamento por arbitramento (CTN, art. 148), não sendo cabível arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente. Segundo defendeu o Município, contudo, seria possível utilizar o valor venal do imóvel para fins de IPTU como piso de tributação relativamente ao ITBI.
Nessa perlenga, assiste razão ao contribuinte ou ao Fisco municipal?
Decisão: Para o STJ, assiste razão a João (contribuinte), uma vez que:
a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;
b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);
c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.
Fundamentos: O art. 35 do CTN prevê que o fato gerador do ITBI consiste na transmissão da propriedade ou de direitos reais imobiliários ou a cessão de direitos relativos a tais transmissões.
Quanto à sua base de cálculo, o art. 38 do CTN dispõe que ela é o “valor venal dos bens ou direitos transmitidos”, sendo que valor venal, para esse efeito, é o valor considerado em condições normais de mercado para as transmissões imobiliárias (ou, simplesmente, valor de mercado).
Para o STJ, conquanto seja possível dimensionar o valor médio de imóveis no mercado – por critérios como a localização, a metragem etc. -, a avaliação de mercado específica de cada imóvel pode sofrer oscilações para cima ou para baixo desse valor médio, a depender da existência de outras circunstâncias como a existência de benfeitorias, o estado de conservação, os interesses pessoais do vendedor (necessidade de venda imediata para cobrir despesas urgentes, mudança de investimentos etc.) e do comprador (proximidade com o trabalho ou com familiares, escassez de imóvel na região etc.) no ajuste do preço.
Ressalvou-se, no entanto, que o preço de venda não reflete necessariamente o valor de mercado (valor venal), pois eventual alienação por preço nitidamente incompatível com este (valor de mercado), independentemente de sua motivação, não permite a sua adoção como parâmetro para definição da base de cálculo do ITBI.
Em relação à sistemática de apuração, o STJ destacou que o ITBI, em razão de seu fato gerador, comporta somente duas modalidades de lançamento originário: por declaração ou por homologação, a depender da legislação municipal de cada ente tributante.
Não se admite, no entanto, que o Fisco proceda, de antemão, ao seu lançamento de ofício, uma vez que não tem condições de possuir, previamente, o conhecimento de todas as variáveis determinantes para a composição do valor do imóvel transmitido.
Nesse andamento, diante do princípio da boa-fé objetiva, deve-se presumir que o valor da transação declarado pelo contribuinte (seja no lançamento por declaração, seja no lançamento por homologação) esteja condizente com o valor venal (de mercado) daquele imóvel, presunção que somente pode ser afastada pelo Fisco se esse valor se mostrar incompatível com a realidade, a justificar a instauração do procedimento próprio para o arbitramento da base de cálculo do ITBI (CTN, art. 148), em que assegurado ao contribuinte o contraditório necessário para apresentação das peculiaridades que justificariam o quantum declarado.
Em vistas dessas premissas, concluiu o STJ que, não obstante a lei refira a base de cálculo do ITBI e do IPTU como sendo o “valor venal” do imóvel, a apuração desse elemento quantitativo difere em relação aos dois impostos, notadamente diante da distinção existente entre os fatos geradores e a modalidade de lançamento de cada um deles.
No IPTU, tributa-se a propriedade, lançando-se de ofício o imposto tendo por base de cálculo a Planta Genérica de Valores aprovada pelo Poder Legislativo local, que considera aspectos mais amplos e objetivos como, por exemplo, a localização e a metragem do imóvel.
Já no ITBI, a base de cálculo deve considerar o valor de mercado do imóvel individualmente considerado, que, como visto, resulta de uma gama maior de fatores, motivo pelo qual o lançamento desse imposto se dá, originalmente e via de regra, por declaração do contribuinte, ressalvado o direito da fiscalização tributária de revisar o quantum declarado, por meio de regular instauração de processo administrativo.
Desse modo, tem-se a impossibilidade de vinculação da base de cálculo do ITBI à estipulada para o IPTU, sequer para fins de considerá-lo como piso de tributação.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: