STJ, REsp 1.973.397. Homicídio. Aplicação da qualificadora da paga (art. 121, 2º, I, do CP). Mandantes. Inaplicabilidade. Princípio da legalidade. Conduta caracterizadora do concurso de pessoas.
Situação Fática: Certo dia, Paulo Medonho, no auge do ódio que nutria por Rodrigo Pancada, contratou Jagunço Mulambo, conhecido “matador” da região, para que “desse um jeito” em Rodrigo. Para tanto, pagou-lhe R$ 5.000,00 (cinco mil reais), prometendo-lhe o pagamento da mesma quantia assim que o “serviço” fosse ultimado.
Controvérsia: O mandante do crime de homicídio responde pela qualificadora da “paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe” (CP, art. 121, § 2º, I) juntamente com o agente executor do crime (sicário)?
Decisão: Para a Quinta Turma do STJ, a qualificadora da paga (art. 121, 2º, I, do CP) não é aplicável aos mandantes do homicídio, porque o pagamento é, para eles, a conduta que os integra no concurso de pessoas, mas não o motivo do crime.
Fundamentos: No cerne da discussão está o art. 30 do CP: “Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.”
Uma qualificadora é uma elementar do crime (‘essentialia delicti’ – dados que constituem o tipo penal)? Se for assim considerada (alguns falam em “circunstância elementar” quanto às qualificadoras), mesmo que de natureza pessoal será comunicada em caso de concurso e agentes (CP, art. 29), por força do art. 30 do CP.
Do contrário (ou seja, se for considerada como mera circunstância, também chamada de circunstância acidental (‘accidentalia delicti’, que representa dado acessório ao crime, dispensável para a configuração em sua modalidade básica, apenas influenciando sobre a quantidade da pena), a comunicabilidade estará interditada.
Há duas posições bem delineadas na matéria:
1ª posição: não se comunica, pois a qualificadora não é uma elementar, mas sim uma circunstância (ou “circunstância acidental”), de sorte que não se comunica se de natureza subjetiva, como é o caso do motivo do crime. Defensores: Fragoso, Bitencourt, Greco, Masson;
2ª posição: comunica-se, porquanto as circunstâncias de natureza subjetiva se comunicam quando se tratar de circunstâncias elementares (elementar do tipo qualificado), como é o caso das qualificadoras.
Defensores: Hungria, Mirabete.
A Quinta Turma do STJ tem firme entendimento no sentido de que a qualificadora da paga (art. 121, 2º, I, do CP) não é aplicável aos mandantes do homicídio, porque o pagamento é, para eles, a conduta que os integra no concurso de pessoas, mas não o motivo do crime.
Ademais, não se cuidaria de elementar do crime de homicídio (ou seja, tratar-se-ia de mera circunstância acidental) para que se pudesse acionar o art. 30 do CP e realizar a comunicabilidade dessa circunstância de índole pessoal para o mandante do homicídio.
É importante notar que esse posicionamento vem sendo reiterado ao menos desde 2017 por esse órgão jurisdicional.
Por outro lado, convém sublinhar que a Sexta Turma somente tem precedentes mais antigos em sentido contrário, o mesmo valendo para o Supremo Tribunal Federal (o qual, por sinal, não tem a palavra final na matéria, já que a discussão é de cunho essencialmente infraconstitucional, cabendo ao STJ uniformizar a interpretação da lei federal – CF, art. 105, III).
Confira julgados nesse sentido: “No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é elementar do tipo qualificado, comunicando-se ao mandante do delito.” (AgInt no REsp n. 1.681.816/GO, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 3/5/2018, DJe de 15/5/2018)
“Homicídio: qualificativa de cometimento do crime mediante paga ou promessa de recompensa que, embora relativa ao mandatário, se comunica ao mandante.” (HC 69940, Relator(a): SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 09/03/1993, DJ 02-04-1993 PP-05621 EMENT VOL-01698-06 PP-01127)
Assim, embora a jurisprudência da Quinta Turma esteja consolidada no sentido de que o mandante do homicídio mediante paga não responde pela qualificadora do art. 121, § 2º, I, do CP somente pelo fato de ser o mandante e de ter efetuado o pagamento ou promessa de pagamento ao sicário (podendo, eventualmente, responder pelo homicídio qualificado mercê de outro motivo ou circunstância, confore o caso concreto), o assunto não é pacífico nos Tribunais Superiores.
É fato, porém, que os julgados contrários ao entendimento da Quinta Turma são todos mais antigos, ao mesmo tempo em que os mais recentes julgados desta Quinta Turma têm sido unânimes, o que torna difícil eventual reversão desse entendimento quando o assunto for levado a julgamento junto à Terceira Seção do STJ (o que se espera ocorra em breve, ante a notória divergência verificada no seio do Tribunal da Cidadania).
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: