STJ, REsp 1.984.277. Locação não residencial. Empresa de coworking. Superveniência de fato imprevisível ou extraordinário. Desequilíbrio estrutural na relação entre as partes. Efeitos da pandemia pela Covid-19.
Situação Fática: Empresa de coworking, na qualidade de inquilina, mantém um contrato de locação não-residencial (comercial) de uma sala situada em edifício empresarial em certa cidade brasileira.
Durante a pandemia de Covid-19 a empresa foi obrigada por ato do poder público a suspender temporariamente suas atividades em razão da imposição de medidas de isolamento e quarentena, conforme previsto nos incisos I e II dos arts. 2º e 3º da Lei 13.979/20.
O ato normativo que impôs a restrição social vigorou por meses e reduziu drasticamente o faturamento da empresa de coworking uma vez que os serviços prestados aos seus clientes (como compartilhamento de secretárias, recepção de escritório, mesas de trabalho e salas de reunião) deixaram de ser demandados em virtude da adoção massiva do home office.
Controvérsia: Nessa situação, poderia a empresa de coworking requerer a redução do valor do aluguel pago ao locador do imóvel?
Decisão: Para o STJ, sim. É cabível revisão judicial de contrato de locação não residencial firmado por empresa de coworking na condição de inquilina, com redução proporcional do valor dos aluguéis em razão de fato superveniente decorrente
Fundamentos: O STJ entendeu serem aplicáveis os pressupostos que autorizam a revisão dos contratos com base nas teorias da imprevisão (art. 317 do CC) e da onerosidade excessiva (arts. 478 a 480 do CC), que exigem que fato superveniente seja imprevisível e extraordinário (ou que suas consequências assim o sejam, conforme Enunciado 175 da III Jornada de Direito Civil do CJF) e que disso, além do desequilíbrio econômico e financeiro, também decorra situação de vantagem extrema para uma das partes.
Ao negar a revisão de contratos de prestação de serviços educacionais durante a pandemia da Covid-19 pelo fato de aulas em universidades privadas passarem de presenciais a remotas, o STJ firmou o entendimento de que “a revisão dos contratos em razão da pandemia não constitui decorrência lógica ou automática, devendo ser analisadas a natureza do contrato e a conduta das partes – tanto no âmbito material como na esfera processual –, especialmente quando o evento superveniente e imprevisível não se encontra no domínio da atividade econômica das partes” (REsp 1.998.206-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/06/2022).
Entretanto, no presente caso, o STJ entendeu de modo diverso e autorizou a intervenção estatal no contrato por haver ficado demonstrada (através de balanços contábeis juntados aos autos) a efetiva redução do faturamento da empresa locatária em virtude das medidas de restrição impostas pela pandemia da Covid-19.
Como a locatária manteve-se obrigada a cumprir a contraprestação pelo uso do imóvel pelo valor integral e originalmente firmado (o locador negou-se a renegociar o contrato, reduzindo o aluguel), a situação evidenciou o desequilíbrio econômico e financeiro do contrato, autorizando a ordem judicial de redução proporcional e temporária do valor dos aluguéis para restabelecimento da justiça comutativa.
In casu, o STJ ratificou a decisão do juiz e do tribunal a quo, que determinou a redução de 50% no valor locativo durante os meses em que vigorou o ato do poder público de restrição social.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: