STJ, REsp 1.990.221. Condição meramente potestativa. Interesse do credor. Possibilidade. Transferência da propriedade de imóvel. Estipulação "tão logo fosse de seu interesse" em favor do credor.
Situação Fática: Credor de um negócio jurídico envolvendo imóveis é beneficiário de uma condição suspensiva que prevê que o devedor deveria transferir-lhe a parte da propriedade “tão logo fosse de seu interesse”.
Controvérsia: Essa condição seria proibida por ser “puramente” potestativa, nos termos do art. 122 do CC?
Decisão: Para o STJ, não. A cláusula seria “meramente” potestativa e, portanto, lícita.
Fundamentos: A questão de fundo envolvia a prescrição ou não da pretensão da obrigação de fazer de transferir parte de um imóvel.
Se se admitisse que a condição suspensiva em comento fosse lícita, mesmo que o negócio jurídico houvesse sido avençado em 1970 ainda não se teria consumada a prescrição em 2006 (quando foi ajuizada a ação judicial), pois enquanto não verificada a ocorrência da condição suspensiva não se terá adquirido o exercício do direito, estando a situação elencada como hipótese legal impeditiva da prescrição no art. 199, I, do CC.
Ante o adjetivo “puro” que qualifica a palavra “arbítrio” no texto do art. 122 do CC (que constituiu uma novidade do atual CC de 2002 em relação ao antigo de 1916), o STJ fez a distinção entre condições “puramente” potestativas e “meramente” potestativas.
O tribunal - valendo-se de exemplos como o da compra e venda feita a contento do art. 509 do CC – entendeu que tais cláusulas só são vedadas quando estatuídas em favor do devedor, sendo admissível que o credor exercesse sua vontade para o implemento da condição suspensiva, porque lhe daria direito à prestação pela qual o devedor já se obrigara desde a contratação do negócio.
O STJ citou os seguintes julgados como precedentes da distinção:
“CONDIÇÃO. CONDIÇÃO POTESTATIVA PURA. A CONDIÇÃO QUE SUBMETE A VONTADE DE UMA DAS PARTES A EFICACIA DO NEGOCIO E POTESTATIVA PURA PARA ESSA PARTE, MAS NÃO PARA A OUTRA, QUE SE OBRIGARA E A ELA FICOU VINCULADA. ART. 115, ULTIMA PARTE, DO CC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (REsp n. 20.248/SP, relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, DJ de 6/10/1997, p. 49994)
“CONDIÇÃO POTESTATIVA. NÃO É VEDADA EM LEI A CONDIÇÃO SIMPLESMENTE POTESTATIVA. INEXISTE, POIS, PROIBIÇÃO A QUE A EFICACIA DO ATO ESTEJA CONDICIONADA A ACONTECIMENTO FUTURO, CUJA REALIZAÇÃO DEPENDA DO DEVEDOR OU POSSA SER POR ELE OBSTADA. DEFESA É A CONDIÇÃO MERAMENTE POTESTATIVA, CORRESPONDENTE A FORMULA "SI VOLAM", QUE ESTA RETIRA A SERIEDADE DO ATO, POR INADMISSIVEL QUE ALGUEM QUEIRA, SIMULTANEAMENTE, OBRIGAR-SE E RESERVAR-SE O DIREITO DE NÃO SE OBRIGAR. ILICITUDE QUE, ENTRETANTO, SE RECONHECE DA CLAUSULA DE ESTATUTO DE ASSOCIAÇÃO CIVIL, A VEDAR O DIREITO DE VOTO A DETERMINADA CATEGORIA DE ASSOCIADOS, CONDICIONANDO-O A FATO QUE LHES É ABSOLUTAMENTE ESTRANHO. INFRINGENCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 1.394, PRIMEIRA PARTE, DO CODIGO CIVIL. DECISÃO, NESSE PONTO, TOMADA PELO VOTO MEDIO.” (REsp n. 20.982/MG, relator Ministro Dias Trindade, Terceira Turma, DJ de 22/3/1993, p. 4537)
Dessa maneira, condições em favor do credor seriam meramente potestativas e admissíveis pelo direito por serem conformes a seriedade do acordo, a estabilidade das relações jurídicas e a boa-fé objetiva.
O relator ainda ressalvou que a cláusula em comento também poderia se revestir da natureza de “termo incerto” - e não de condição suspensiva - hipótese em que seria lícito ao credor interpelar o devedor para o vencimento da obrigação nos termos do art. 134, parte final, do CC, hipótese em que igualmente não correria a prescrição nos termos do art. 199, II, do CC.
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: