STJ, RMS 57.258. Escrivão de serventia não estatizada. Aposentadoria compulsória. Não cabimento. Exceções. Ocupante de cargo público. Remuneração. Cofres públicos.

Situação Fática: João é notário e José é registrador junto aos serviços extrajudiciais de Tribunal de Justiça. João não percebe remuneração direta dos cofres públicos, sendo remunerado exclusivamente por custas e emolumentos.
Já José se submete a um regime “misto”, percebendo como retribuição de sua atividade tanto uma remuneração direta do Estado como custas e emolumentos.
Controvérsia: João e José estarão sujeitos à aposentadoria compulsória ao completarem 75 anos?
Decisão: Para o STJ, apenas José se submete ao regime de aposentadoria compulsória por perceber, ainda que parcialmente, retribuição direta dos cofres públicos através de remuneração.
Para que o tabelião ou o oficial de registro não esteja sujeito à aposentação obrigatória aos 75 anos é essencial que a retribuição de sua atividade seja exclusivamente através de custas e emolumentos pagas pelos usuários do serviço, é dizer, que não perceba remuneração direta do Estado, o que é o caso de João. RMS 57.258-GO.
Fundamentos: No plano constitucional, desde a EC 20/98 não se admite mais que agente público que não ocupe cargo público (mesmo que exerça alguma função ou atividade pública por delegação ou mandato) seja segurado do RPPS.
É o que dispõe o art. 40, caput, da CF, mesmo com a redação conferida pelas EC 41/03 e 103/19, que mantiveram neste ponto o mesmo que já preceituava a EC 20/98.
O limite de idade para aposentadoria compulsória na administração pública que era de 70 anos foi majorado para 75 anos conforme EC 88/15 que conferiu nova redação ao inciso II do § 1º do art. 40 da CF.
Para os ministros dos tribunais superiores e do TCU a EC 88/15 adquiriu a forma de norma constitucional de eficácia plena através do acréscimo do art. 100 no ADCT.
Em relação aos demais cargos públicos, a EC 88/15 adquiriu a forma de norma constitucional de eficácia limitada, pelo fato de o inciso II, in fine, do § 1º do art. 40 da CF necessitar da edição de lei complementar para produzir efeitos jurídicos.
Regulamentando a norma constitucional, o art. 2º da LC 152/15 estendeu o limite de 75 anos para a “expulsória” de todos os demais cargos públicos civis, com uma pequena regra de transição para o serviço diplomático, conforme parágrafo único.
O art. 3º da LC 152/15 revogou a previsão de aposentadoria compulsória do policial aos 65 anos de idade até então prevista no art. 1º, I, da LC 51/85.
No RGPS – diferentemente do RPPS – não há a previsão de aposentadoria compulsória ao septuagenário (aos 70 anos antes da LC 152/15 ou 75 anos após a LC 152/15).
O art. 51 da Lei 8.213/91 não prevê propriamente uma aposentadoria compulsória, mas uma espécie de faculdade de a empresa requerer a aposentadoria quando atingida uma certa idade do empregado, levando-se em consideração o sexo.
A norma veicula uma faculdade e não uma obrigação, é dizer, a aposentadoria pode ou não ser requerida pela empresa.
Para fins de interpretação do dispositivo no âmbito do RGPS o poder público é equiparado à empresa segundo o inciso I do art. 14 da Lei 8.213/91.
Destacamos que não há impedimento de que o segurado aposentado no RGPS continue trabalhando na iniciativa privada (no âmbito do poder público veremos que a EC 103/19 trouxe algumas mudanças) nem mesmo se veda eventual retorno à atividade laboral após os 75 anos, conforme consta da regra permissiva do § 2º do art. 18 da Lei 8.213/91.
Daí é importante consignar que, em razão de não ocuparem cargo público efetivo, os notários e registradores delegados dos serviços públicos referidos no art. 236 da CF não se submetem à aposentadoria compulsória, segundo a jurisprudência pacífica do STF.
Contudo, apenas os notários (tabeliães) e registradores (oficiais de registro) que sejam remunerados exclusivamente por custas e emolumentos nos termos do § 2º do art. 236 é que realmente exercem a função delegada do poder público prevista no caput do art. 236.
Cabe salientar que quem arca com essas custas e emolumentos são os próprios usuários dos respectivos serviços.
Na hipótese de notários ou registradores perceberem alguma retribuição, ainda que parcial, custeada diretamente pelos cofres públicos (ex. contracheque com salário, gratificação, adicional, férias etc.) haverá a ocupação cargo público – e não apenas de mera função pública delegada – a ensejar a incidência da regra constitucional de aposentadoria compulsória prevista no art. 40, § 1º, II, da CF.
Por fim, mesmo que não abordado no julgado, lembramos que mesmo que o RGPS não preveja o instituto da aposentadoria compulsória (diferentemente do RPPS), desde a EC 103/19 qualquer aposentadoria implica na extinção do vínculo existente entre o agente público (que ocupe cargo, emprego ou função) e o Estado, o que no nosso entender abarcaria também notários e registradores, que, doravante, se se aposentarem voluntariamente (mesmo no RGPS) perderão a delegação constitucional de sua atividade de notas e registros.
É o que consta da nova redação do § 14 do art. 37 da CF (“A aposentadoria concedida com a utilização de tempo de contribuição decorrente de cargo, emprego ou função pública, inclusive do Regime Geral de Previdência Social, acarretará o rompimento do vínculo que gerou o referido tempo de contribuição.”).
Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo: